Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul
2ª Vara Judicial da Comarca de Santo Antônio da Patrulha

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PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL Nº 5000008-02.2018.8.21.0065/RS

AUTOR: CRISTIELE SILVA DOS SANTOS

RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

SENTENÇA

Vistos.

CRISTIELE SILVA DOS SANTOS, já qualificada nos autos, ajuizou AÇÃO PREVIDENCIÁRIA (sic) contra INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, Autarquia Federal, igualmente qualificada. Disse contar com 25 anos de idade, sem condições de prover seu sustento, sendo portadora de epilepsia (CID G-40), retardo mental moderado (CID F-71) e episódios depressivos (CID F-32). Referiu que reside com sua genitora, e que são sustentadas apenas por um benefício previdenciário recebido por esta, (pensão por morte no valor de R$ 1.244,52), passando por sérias dificuldades econômicas. Solicitou AJG, requereu a concessão liminar do benefício de prestação continuada. No mérito postulou a procedência da ação para condenar a autarquia demandada à concessão do benefício. Juntou docume tos (Evento 2).

O pedido de tutela de urgência foi indeferido (Evento 2).

Citada, a Autarquia ré apresentou contestação (Evento 2). Disse que o benefício foi indeferido administrativamente porque a parte autora não preenche os requisitos necessários para sua concessão, considerando não ter sido comprovada a situação de miserabilidade do grupo familiar. Sustentou que os requisitos de incapacidade e miserabilidade previstos para o benefício em tela são cumulativos, não estando preenchidos no caso em análise. Ao final, a improcedência da ação, condenando-se a parte autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios. Anexou documentos.

Houve réplica (fls.Evento 2)

O feito foi instruído com a realização de perícia sócio-econômica (Evento 35).

Oportunizada vista às partes, não foi requerida a produção probatória.

Vieram, então, os autos conclusos para sentença.

É o relatório.

Fundamentação.

Postula a parte autora o benefício de prestação continuada (benefício assistencial e não previdenciário), previsto no art. 20 da Lei 8.742/93:

Art. 20.  O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.                   (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)        (Vide Lei nº 13.985, de 2020)

§ 1o  Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.                     (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 2o  Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.                       (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)         (Vigência)

§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja:       (Redação dada pela Lei nº 13.982, de 2020) 

I - inferior a um quarto do salário mínimo;        (Redação dada pela Medida Provisória nº 1.023, de 2020)       Vigência

II - (VETADO).      (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)

§ 4o  O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.                     (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

§ 5o  A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.               (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

         § 6º  A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS.                       (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)

Busca o benefício em tela assegurar assistência social aos necessitados, assim considerados os objetivos desta, consoante art. 2º da Lei 8.472 e art. 203, inciso V da Constituição Federal, respectivamente:

Art. 2º. A assistência social tem por objetivos:

I - a proteção social, que visa à garantia da vida, à redução de danos e à prevenção da incidência de riscos, especialmente:

(...)

e) a garantia de 1 (um) salário-mínimo de benefício mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família;

 

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

(...)

V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

Assim, para a concessão do benefício em tela faz-se necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: 1) ser o requerente pessoa portadora de deficiência ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (art. 34 da Lei nº 10.741/03); 2) não possuir meios de subsistência próprios ou de tê-la provida por sua família, cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 do salário-mínimo.

Outrossim, vale lembrar que de acordo com a orientação jurisprudencial majoritária, o fato de a renda familiar per capita ser superior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, não impede que outros fatores sejam considerados para a avaliação das condições de sobrevivência da parte autora e de sua família. Deve-se analisar também as condições sociais, econômicas e culturais da parte requerente, bem como a efetiva possibilidade de seu (re)ingresso no mercado de trabalho.

No caso dos autos, é controversa apenas a alegada miserabilidade da parte autora, pois comprovada sua condição de deficiente pelos laudos e atestados juntados com a petição inicial (Evento 2).

Resta, portanto, analisar o requisito da miserabilidade.

Neste tópico, a perícia sócio-econômica deixa clara a necessidade de concessão do benefício para fins de garantir uma vida minimamente digna à parte requerente, uma vez que o grupo familiar vive exclusivamente de pensão por morte recebida por sua genitora, com valor pouco superior ao salário mínimo.

Outrossim, conforme relatado pela assistent social e pelos documentos juntados aos autos, tanto a requerente como sua genitora fazem uso de remédios controlados, inclusive alguns não disponibilizados pelo SUS, o que faz com que o custo de vida aumente exclusivamente para manutenção da saúde.

Assim, considerando as necessidades básicas da família como moradia, alimentação vestuário, etc, se faz necessária a concessão do benefício assistencial, a fim de garantir a dignidade da pessoa humana à requerente.

Acerca dos índices aplicáveis, em se tratando de condenação contra a Fazenda Pública, deve-se observar conjuntamente o disposto na Lei Federal nº 9.494/97, o resultado do julgamento proferido pelo STF na ADIn 4.357/DF, bem como o entendimento jurisprudencial que veio a se consolidar no âmbito do STJ, após tal ADIn, especialmente os Recursos Especiais sujeitos à sistemática do art. 543-C, do CPC e da Resolução STJ n. 08/2008 (Recursos Repetitivos), quais sejam os Recursos Especiais n. 1.356.120/RS, julgado em 14.08.13, e n. 1.270.439/PR, julgado em 02.08.13.

De acordo com tais entendimentos, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade parcial, por arrastamento, do art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, por entender que a taxa básica de remuneração da poupança não tem por objetivo refletir a inflação acumulada e, portanto, não pode servir de parâmetro para a correção monetária a ser aplicada aos débitos da Fazenda Pública.

A declaração de inconstitucionalidade parcial por arrastamento do art. 5º da Lei 11.960/09, assim, impôs um desmembramento entre os juros de mora (que continuaram regidos pela regra do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação da Lei 11.960/09, ou seja, com base no índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança) e a correção monetária (que passou a ser calculada pelo IPCA, índice mais amplo que o IPC e que melhor reflete a inflação acumulada do período, segundo orientação do STF e STJ).

Já quanto ao termo inicial dos juros moratórios, também segundo entendimento do STJ, não tiveram seu termo inicial modificado pela sistemática imposta no art. 1º-F da lei 9.494/97, com redação da Lei 11.960/09. Portanto, o termo inicial da fluência dos juros moratórios se dá com a citação inicial, quando se trata de descumprimento de obrigações contratuais ou legais (art. 405 do CC e art. 219 do CPC), ou a partir da data do evento danoso, quando se tratar de responsabilidade por ato ilícito, nos termos do art. 398 do CC.

Por fim, entendo que preenchidos os requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil, fazendo jus a concessão da tutela de urgência, a fim de que a autora passe a receber o benefício mensal, já que a situação de miserabilidade justifica po deferimento da medida.

Diante do acima exposto, forte no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE a presente ação para o fim de:

a) DETERMINAR ao INSS que conceda e implante o benefício previsto no art. 20 da Lei 8.472/93 à autora CRISTIELE SILVA DOS SANTOS;

b) CONDENAR O INSS a pagar à parte autora o benefício em tela, desde a data do primeiro requerimento administrativo1, impondo-se a correção monetária, a contar de cada vencimento, pelo IPCA e incidindo juros de mora com base no índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação da Lei 11.960/09), a contar da citação.

DETERMINO a imediata concessão do benefício, a partir do mês subsequente à publicação da presente decisão, na forma do artigo 300 do CPC.

Oficie-se ao INSS.

Sucumbente, arcará o INSS com as custas processuais, na forma do Ofício-circular nº 03/2014, e honorários advocatícios ao procurador da parte autora, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação, incluídas apenas as prestações vencidas, nos termos da Súmula 111/STJ2, assim considerados o trabalho realizado e o tempo despendido para tanto, bem com o valor e a natureza da causa, em observância ao art. 85, §3º, inciso I do CPC.

Publicada e registrada eletronicamente.

Intimem-se.

Diligências legais.

2 “OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, NAS AÇÕES PREVIDENCIÁRIAS, NÃO INCIDEM SOBRE PRESTAÇÕES VINCENDAS.” (DJ 13.10.1994 p. 27430)



Documento assinado eletronicamente por MARIANA AGUIRRES FACHEL, Juíza de Direito, em 24/2/2021, às 17:14:24, conforme art. 1º, III, "b", da Lei 11.419/2006. A autenticidade do documento pode ser conferida no site https://eproc1g.tjrs.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=consulta_autenticidade_documentos, informando o código verificador 10006116611v3 e o código CRC 17ffd364.